RESUMO: O presente estudo visa trazer disposições gerais acerca da arbitragem, destacando que se trata de uma técnica extrajudicial de resolução de conflitos, alternativa à via judicial, mais célere e menos formal que esta última. Este artigo tem como objetivo analisar algumas questões envolvendo a arbitragem, seu conceito, as suas formas e possibilidades de aplicação, bem como seus principais efeitos. Para tanto, realizou-se uma pesquisa bibliográfica, considerando-se as contribuições de autores como MEDINA (2017), DONIZETTI (2017), AMORIM (2017), DIDIER (2017), GONÇALVES (2017), dentre outros, procurando-se enfatizar a importância de ser ter um método de resolução de conflitos em que as próprias partes interessadas e devidamente capazes podem, através de um acordo de vontades, entregar a solução de seus litígios, desde que pertinentes a direitos patrimoniais disponíveis, a um terceiro de sua confiança. Concluiu-se pela relevância da arbitragem, uma vez que se trata de método capaz de ampliar o acesso à justiça, ao estabelecer uma técnica de resolução de conflitos mais rápida e menos formal do que àquela aplicada pelo Poder Judiciário e que, inclusive, por tal razão, além de priorizar a vontade dos envolvidos, colabora de forma significativa na redução da carga de trabalho do assoberbado Poder Judiciário.
Palavras-chave: Arbitragem. Conflito. Consensual. Extrajudicial.
Introdução
As formas extrajudiciais de resolução de conflitos sempre estiveram presentes no ordenamento jurídico brasileiro, havendo disposições esparsas acerca delas no Código Penal, Código Civil, Consolidação das Leis do Trabalho, Código de Processo Civil de 1.973, Lei de Arbitragem, Lei dos Juizados Especiais, dentre outros. Contudo, com o Código de Processo Civil de 2015, tais métodos de resolução de conflitos, que estavam disciplinados de modo genérico e esparso, ganharam especial relevância, passando a ser especificamente regulamentados.
Neste contexto, dentre as formas extrajudiciais de resolução de conflitos trazidas pelo atual código processualista civil, o presente trabalho destina-se a tratar da arbitragem como método alternativo à via judicial.
Dentro desta perspectiva, pretende-se trazer alguns aspectos gerais acerca da arbitragem, como seu conceito, natureza jurídica, formas de aplicação e efeitos, demonstrando que se trata de um procedimento mais célere e menos formal do que o judicial, bem como uma forma que garante maior acesso e promoção de justiça àqueles que possuem conflitos de interesses.
Isto porque, embora Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXVIII disponha que “a todos, tanto em âmbito administrativo quanto judicial, é assegurada a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 1988), é cediço que se trata de uma realidade diversa daquilo que efetivamente ocorre com o processo judicial no Brasil, em razão do assoberbamento do Poder Judiciário, tendo como causa o excesso de processos. “Se vive num tempo marcado por uma cultura exacerbada de litigância, onde o elevado número de processos judiciais, aliado à morosidade do sistema, tem abarrotado os tribunais”. (MARQUES, 2016).
Assim, a arbitragem, método heterocompositivo de solução de conflitos, caracterizado pela autonomia da vontade, através da qual os interessados, de comum acordo, escolhem um terceiro para decidir e solucionar seus conflitos, mostra-se como um meio simples, flexível, célere e eficiente de dirimir controvérsias, de modo a garantir a todos o acesso à justiça, que atualmente se encontra impactado pela morosidade da via judicial.
Desenvolvimento
Forma antiga de resolução de conflitos, a arbitragem pautava-se, nos tempos primórdios, na vontade das partes de submeterem a decisão acerca de seus conflitos a algum sujeito, que de algum modo, exercia influência sobre elas, como o ancião ou o líder religioso da comunidade. (NEVES, 2017, p.77).
Regulamentada no Brasil pela Lei nº 9.307/1996 e pelos artigos, 3, §1º, 42, 237, inciso IV, todos do atual Código de Processo Civil, dentre outras disposições esparsas deste último, a arbitragem mantém as principais características de seus primeiros tempos, já que ainda se pauta no acordo de vontades dos envolvidos e na escolha de um terceiro de sua confiança para dirimir seus conflitos. Contudo, sofreu modificações significantes com a edição da Lei nº 13.129/2015, a qual autorizou a utilização da arbitragem também pela administração pública direta e indireta, bem como regulamentou as questões envolvendo as tutelas de urgência no procedimento arbitral. (GONÇALVES, 2017, p.813).
Anteriormente à edição da Lei nº 9.307/1996, embora a arbitragem já existisse no Brasil, era pouco difundia e utilizada, em razão da sua pouca praticidade, principalmente porque a sentença dela decorrente dependia de homologação judicial, para que, só então, pudesse ser usada como título executivo extrajudicial. (GONÇALVES, 2017, p.813).
Atualmente, devido às transformações operadas Lei nº 9.307/1996, tornou-se dispensável a homologação da sentença arbitral por Juiz de Direito, constituindo-se, ainda, diretamente, como título executivo judicial. (GONÇALVES, 2017, p.813).
Assim, a arbitragem trata-se de uma técnica heterocompositiva de solução de conflitos, através da qual as partes interessadas e capazes elegem uma terceira pessoa, a sua escolha e de sua confiança, para auxiliarem-nas na solução amigável e imparcial de seus conflitos, relativos a direitos disponíveis.
A arbitragem consiste no julgamento do litígio por terceiro imparcial, escolhido pelas partes. É tal qual a jurisdição, espécie de heterocomposição de conflitos, que se desenvolve mediante trâmites mais simplificados e menos formais do que o processo jurisdicional. (DONIZETTI, 2017, p.172).
Tem-se que a arbitragem pressupõe pessoas capazes e só pode versar sobre direitos patrimoniais disponíveis. Gonçalves (2017, p.814) leciona que o artigo 1º, caput, da Lei nº 9.307/1996 ao trazer tal disposição, acaba por estabelecer limitações de ordens subjetiva e objetiva. Subjetiva porquanto afasta a possibilidade de utilizar-se da arbitragem para solucionar conflitos envolvendo interesses de incapazes e objetiva, uma vez que impede que direitos não patrimoniais ou indisponíveis sejam convencionados pela arbitragem.
A terceira pessoa de comum acordo escolhida pelas partes, o chamado árbitro, também deve ser pessoa capaz e natural e enquanto desempenha suas funções, se equipara a funcionário público para fins penais. (DONIZETTI, 2017, p.173).
O árbitro (ou o tribunal arbitral, no caso de constituir-se um colegiado), observado um procedimento que se desenvolve em contraditório (art. 21, § 2o, da Lei no 9.307/1996), proferirá decisão, a qual recebe da lei de regência a denominação sentença arbitral (art. 23 da Lei nº 9.307/1996). (CÂMARA, 2017, p.288).
Outrossim, deve-se ponderar, que embora a arbitragem exclua do Poder Judiciário o julgamento de um conflito, já que será submetido à decisão do árbitro, como mencionado, não se trata de técnica inconstitucional, como discutia-se nos primórdios da implantação da Lei nº 9.307/1996 no Brasil, uma vez que não há qualquer obrigatoriedade em seu uso, sendo de livre vontade das partes envolvidas.
Tem-se que “não há qualquer vício de inconstitucionalidade na instituição da arbitragem, que não é compulsória; trata-se de opção conferida a pessoas capazes para solucionar problemas relacionados a direitos disponíveis”. (DIDIER, 2017, p.192).
Deve-se observar, contudo, que o Juízo arbitral não substitui integralmente a atividade jurisdicional do Estado, uma vez que a própria execução da sentença arbitral e as próprias medidas de urgência, ainda são dependentes do Poder Judiciário.
O monopólio estatal, assim, recai sobre a tutela coativa dos direitos. As medidas de urgência (cautelares, p.ex.) serão conhecidas pelo árbitro quanto à sua pertinência, contudo, executadas pelo juiz estatal, a este requeridas pelo árbitro através do que o CPC/2015 denomina de carta arbitral (arts. 189, IV e 260, § 3.º do CPC/2015; art. 22-C da Lei 9.307/1996, inserido pela Lei 13.129/2015). (MEDINA, 2017, p.58).
Quanto à natureza jurídica da arbitragem, a doutrina majoritária entende que se trata de equivalente jurisdicional.
O já mencionado art. 3º, §1º do Novo CPC parece ter consagrado o entendimento de que a arbitragem não é jurisdição, porque, ao prever a inafastabilidade da jurisdição, salvo a arbitragem, fica claro que essa forma de solução de conflitos não é jurisdicional. E no mesmo sentido vai o art.42 do Novo CPC ao prever que as causas cíveis serão processadas e decididas pelo juiz nos limites de sua competência, ressalvado às partes o direito de instituir o Juízo arbitral, na forma da lei. (NEVES, 2017, p.78).
Contudo, parte importante da doutrina defende que possui natureza jurisdicional. Neves (2017, p.78) discorre que aqueles que possuem esse segundo posicionamento, fundamentam-no no fato de que a submissão do conflito à arbitragem gera uma sentença arbitral, que independe de homologação de Juiz de Direito e que faz coisa julgada material, impossibilitando o Poder Judiciário de reavaliar o seu conteúdo, situação que justifica sua natureza jurisdicional.
A decisão arbitral fica imutável pela coisa julgada. Poderá ser invalidada a decisão, mas, ultrapassado o prazo de noventa dias, a coisa julgada torna-se soberana. É por conta desta circunstância que se pode afirmar que a arbitragem, no Brasil, não é equivalente jurisdicional: é propriamente jurisdição, exercida por particulares, com autorização do Estado e como consequência do exercício do direito fundamental de autorregramento (autonomia privada). (DIDIER, 2017, p.194).
Não mais se controverte, hoje, sobre a natureza jurisdicional da arbitragem. O art. 515, VII, do CPC/2015 (correspondente ao art. 475-N, IV, do CPC/1973) estabelece que a sentença arbitral é título executivo judicial. Na jurisprudência, reitera-se a orientação no sentido de que “a atividade desenvolvida no âmbito da arbitragem tem natureza jurisdicional. (MEDINA, 2017, p.58).
Outrossim, nos termos do artigo 3º, da Lei nº 9.307/1996, tem-se que as partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao Juízo arbitral, mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral. (BRASIL, 1996).
Neste contexto, a convenção de arbitragem, enquanto negócio jurídico enseja a extinção do feito sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso VII, do Código de Processo Civil, observando-se, contudo, que consoante disposição do artigo 337, §º5 do mesmo dispositivo legal, não pode ser reconhecida de ofício pelo julgador.
Através da cláusula compromissória, que deve ser escrita e se dá por meio de contrato “convencionam as partes que as demandas decorrentes de determinado negócio jurídico serão resolvidas pelo Juízo arbitral. Trata-se de deliberação prévia e abstrata, anterior ao litígio”. (DONIZETTI, 2017, p.172).
Cláusula compromissória é o pacto pelo qual as partes se comprometem a submeter à arbitragem os litígios que possam surgir, relativamente a determinado contrato. É uma convenção pela qual as partes prometem, reciprocamente, submeter à arbitragem eventuais conflitos que possam surgir a respeito de determinado contrato. (GONÇALVES, 2017, p.816).
Noutro modo, o compromisso arbitral se dá depois que o litígio já está estabelecido e pode ser judicial ou extrajudicial. As partes optam por submeter tal litígio à apreciação do Juízo arbitral, como forma alternativa ao Judiciário.
Já o compromisso arbitral é o acordo de vontades posterior ao litígio, para submetê-lo ao juízo arbitral. O compromisso arbitral pode existir com ou sem a cláusula compromissória e pode ser celebrado antes ou mesmo no curso da demanda judicial. (DONIZETTI, 2017, p.172).
A sentença arbitral, meio pelo qual o árbitro externaliza a sua decisão, nos termos dos artigos 31 a 33, da Lei nº 9.307/1996, trata-se de título executivo judicial e independe de homologação judicial, produzindo efeitos imediatamente, estes que são os mesmos produzidos pela sentença judicial, inclusive quanto à coisa julgada material. O controle judicial se dá unicamente em relação à validade da sentença arbitral e a seus aspectos formais, mas não quanto ao mérito.
Também, deve-se mencionar, que a execução da sentença arbitral somente poderá ser promovida perante a justiça estatal e, eventualmente, quando há necessidade de concessão de tutelas de urgência e demora na formalização do compromisso arbitral, o pedido poderá ser feito judicialmente. (DONIZETTI, 2017, p.174).
Impende destacar, neste aspecto, que os pedidos de cooperação entre o Juízo arbitral e o Juízo estatal se dão através da carta arbitral, instrumento este trazido como novidade pelo atual Código de Processo Civil, em seu artigo 237.
Desta forma, passados alguns aspectos gerais acerca da arbitragem, a fim de que se pudesse compreender como se dá o seu procedimento, observa-se que ela, extrajudicialmente, possibilita às partes envolvidas, de comum acordo, elegerem um terceiro para dirimir seus conflitos, funcionando como método alternativo à via judicial e como técnica eficiente para harmonização social, de forma a melhorar, inclusive, a prestação jurisdicional, já que evita que novos processos sejam interpostos perante o assoberbado Poder Judiciário.
A arbitragem aparece como forma alternativa de solução de conflitos de interesses, que prescinde da intervenção do Judiciário. Disso podem advir algumas vantagens. Por exemplo:
-é notória a sobrecarga de processos nos juízos e tribunais e a multiplicidade de recursos que podem retardar o seu desfecho. A arbitragem poderá ter a vantagem de dar uma solução mais rápida às controvérsias;
- às vezes, a questão controvertida é de natureza muito específica e exige um conhecimento técnico particular. As partes podem atribuir a solução a árbitros dotados dos conhecimentos exigidos. A questão seria dirimida pelo juiz, se submetida ao Judiciário, mas ele eventualmente teria de valer-se de peritos, que encareceriam ou retardariam a solução. (GONÇALVES, 2017, p.814).
Assim, a arbitragem ganhou especial relevância com a edição da Lei nº 9.307/1996 e com novas disposições acerca dela trazidas pelo atual Código de Processo Civil em razão de propiciar a ampliação do acesso à justiça, de garantir a aplicação da autonomia da vontade e de colaborar significativamente na redução das demandas judiciais.
Conclusão
É cediço que o conflito é inerente a toda relação social, fazendo parte do cotidiano das pessoas. Contudo, deve-se ter em conta, que a solução do conflito deve ser pautada em um sentimento de satisfação a todos os envolvidos, a fim de que a partir dos conflitos possam ser as relações sociais aperfeiçoadas.
Neste contexto, tem-se a arbitragem, em que os próprios interessados, de comum acordo, buscam a sua pacificação, escolhendo uma pessoa de sua confiança para auxiliá-los a solucionar os problemas em comum, buscando de forma participativa, harmoniosa e respeitosa, uma solução que seja da melhor forma satisfatória a todos.
Assim, busca a arbitragem, enquanto forma extrajudicial de resolução de conflitos, promover a harmonia entre os envolvidos a longo prazo, bem como a diminuição do desgaste demasiado emocional e financeiro inerente ao processo judicial.
Ademais, neste aspecto, deve-se destacar, como já mencionado, que além de tal método beneficiar a todos os interessados, já que pautado na autonomia de suas vontades, colabora significativamente na redução da quantidade de processos judiciais em trâmite, desafogando o acúmulo do trabalho dos Tribunais.
Diante disto, levando em conta a redução significativa de processos judiciais em trâmite, bem como a satisfação plena dos interessados, já que irão se ajustar à solução dada pela pessoa a quem confiaram a resolução de seus conflitos, trata-se de um método adequado, eficiente e célere de solução de uma relação social litigiosa.
Assim, buscou-se com este trabalho, demonstrar o benefício da utilização da arbitragem como forma extrajudicial de resolução de conflitos, de modo a incentivar a sua aplicação, destacando que se trata de uma maneira mais participativa de se alcançar a satisfação dos interesses de todos os envolvidos (pacificação social), bem como um modo bastante significativo de colaborar no desafogamento do Poder Judiciário.
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Graduada em Direito pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, campus de Francisco Beltrão – Pr. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes – 2017. Assistente de Juiz de Direito do Juizado Especial Cível, Criminal e da Fazenda Pública na Comarca de Francisco Beltrão – Pr,(2015-2016). Atualmente e desde o mês de fevereiro de 2016, atua como Oficial de Promotoria do Ministério Público do Estado do Paraná, na Comarca de Francisco Beltrão – Pr.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, Luana Strapazzon de. Arbitragem como método extrajudicial eficaz de resolução de conflitos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 out 2023, 04:26. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos /63448/arbitragem-como-mtodo-extrajudicial-eficaz-de-resoluo-de-conflitos. Acesso em: 28 dez 2024.
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